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Novas fronteiras para o jornalismo

Publicado em 09/01/2007
por Developer Unifagoc

Socializar conhecimento é uma vocação jornalística perfeitamente adequada ao espaço, aos mecanismos, aos relacionamentos e às demandas do mundo digital. Até porque, nas redes universais da web, também é muita a ignorância em circulação.
1. Contornos da crise

Entramos definitivamente, em sem hipóteses de retorno, na era dos blogueiros. Só nos Estados Unidos, já são 12 milhões. Calcula-se que pelo menos um terço deles assumem deliberadamente o papel de jornalistas-cidadãos, e creio que a proporção tenderá a ser a mesma entre nós. São contornos de um cenário que coloca o jornalismo tradicional diante da mais importante e complexa crise de sua história.

A discussão da crise se torna inexoravelmente obrigatória, porque se trata da destruição de conceitos e preceitos em que por décadas acreditamos.
Conceitos e preceitos que despertaram ideais e orientaram escolhas dos que, como nós, aderiram ao jornalismo para nele experimentar o poder de, pela notícia e pelo comentário, contribuir para um mundo mais justo, mais livre, mais humanista.
Pelo menos comigo foi assim. Ao decidir ser jornalista, movia-me a utopia de um mundo fundamentado em direitos, o principal deles o direito à informação, em nome do qual e em torno do qual a modernidade organizou o discurso político-social do jornalismo, dentro das democracias. E o discurso nos fez uma espécie de “donos da verdade”, beneficiários da crença social de que a linguagem jornalística se fundamenta no pressuposto da veracidade e por isso merece ser acreditada.

Sabemos todos que, aqui e ali, em maior ou menor escala (conforme a época e a cultura), o discurso político-social desse jornalismo idealista, vinculado a uma certa idéia do bem, cumpria função de manto hipócrita, para esconder práticas interesseiras de vassalagem ao poder político e/ou econômico. Mas essa teria de ser outra discussão, colocada na moldura da Ética e da Moral.

Ao tema de hoje, o que interessa é a face nova do mundo da informação, razão de ser da nossa perplexidade: para circular no mundo, a notícia já não precisa passar pelas redações. Qualquer sujeito, pessoa ou instituição, pode espalhar ao mundo as suas próprias notícias, com ou sem a participação de jornalistas.

As tecnologias da vida digital, hoje de fácil acesso, como o computador e o telefone celular, tornam possível a qualquer pessoa se assumir repórter e narrador do seu pedaço de mundo real. Graças às novas possibilidades de captar e relatar fatos, alguém usou o telefone celular para espalhar aos quatro ventos as imagens do enforcamento de Saddam Hussein. E deu ao acontecimento novos significados.

Nesse novo mundo, o espaço do comentário, antes privilégio das elites do jornalismo, tornou-se espaço infinito, disponível em blogues e sites de relacionamento freqüentados por 500 milhões de usuários.

São as pessoas em pleno uso do direito de dizer. E isso é culturalmente maravilhoso.
2. Âmago da crise

Há, evidentemente, a interpretação catastrofista, segundo a qual estamos ameaçados por incontrolável desgraça pós-moderna. Jogo em outro time. E tenho uma boa razão para rejeitar o catastrofismo: a convicção pessoal de que é preferível um mundo onde todos possam dizer, como alternativa ao arrogante mundo onde só os jornalistas decidiam o que devia ser dito e quem poderia dizer.

A discussão não é simples. Estou convencido, porém, de que, no âmago da crise, está a questão da razão de ser do jornalismo e dos jornalistas – que era uma, e deixou de ser.

Teremos que descobrir e educar uma nova razão de ser. Para o jornalismo e para os jornalistas. Foi o que pensei seis ou sete semanas atrás, ao ouvir uma palestra do jornalista Washington Novaes, em um seminário que envolvia gente de comunicação. Ele falava sobre a questão da sustentabilidade, com dados precisos e análises especializadas de estudiosos devidamente citados. Revelava, por exemplo, que o consumo humano de recursos naturais já supera em 25% a capacidade de regeneração do planeta.

Tive a honra de mediar o seminário. E quando perguntei a Washington Novaes como gostaria de ser apresentado, ele respondeu com clareza e firmeza: “Jornalista. É o que sou”.

Um jornalista entregue à tarefa, por ele próprio escolhida, de socializar conhecimento. É o que Washington Novaes faz, na intensa atividade profissional que desenvolve, reunindo, catalogando e relacionando dados, falas e fatos, estudos e revelações, e depois produzindo sínteses em forma de artigos ou reportagens, para a difusão jornalística, cujo alcance a Internet ampliou extraordinariamente. E assim ganha a vida, no nobre trabalho de socializar conhecimento, sem demagogias nem proselitismos militantes.

Socializar conhecimento é uma vocação jornalística perfeitamente adequada ao espaço, aos mecanismos, aos relacionamentos e às demandas da Internet. Até porque, nas redes universais da web, também é muita a ignorância em circulação.

Com ou sem YouTube, para Washington Novaes, e para o seu trabalho de socializar conhecimento, jamais faltará tempo, espaço e razão de ser.

fonte: 5/1 – Carlos Chaparro – Comunique-se